Quanto Custa a Eternidade?
Quanto custa a eternidade?
Estamos velando um corpo.
Bem, primeiramente
preciso explicar a minha futura esposa que este texto foi incrivelmente difícil
de conceber. Não que eu não saiba escrever. É que não sei escrever sobre ela,
então tenho que usar minhas impressões a respeito dela para tentar me fazer
entender. E essas sensações dizem respeito a mim. Então, tenho que usar minhas
sensações para falar sobre ela.
Minha mulher é minha viúva, agora.
Eu acabei de morrer. Estou deitado em uma urna, em meu
funeral. Estranhamente, ainda sou capaz de relatar o que acontece.
Eu morri. Mas ouço as pessoas falarem ao meu redor. Em
especial, ouço o choro silencioso de minha mulher. Sinto ela e suas emoções e
afetos por mim.
Como eu adoraria fazer uma poesia para ela... mas acho que
ela entende que não sei fazer poesia. Sei olhar para ela e admirá-la, mas não
sei poetizar sobre ela.
Mas vamos nos lembrar de que estou morto e a ouço e a vejo,
apesar disso.
Ela se lembra dos nossos toques. Dos nossos beijos. Ela me
afaga em suas lembranças. Vagamente percebe que não está tendo cólicas aquele
mês.
Minha menina pede que eu não a deixe. Eu a ouço. Mas já
parti, não posso voltar, por mais que queira. Seus lábios nunca sairão de minha
memória, seu olhar e seu sexo nunca me abandonarão, mas...
Puxa, eu tive que partir antes.
Assisto uma cena icônica em que minha menina corre para
pegar uma bola de vôlei.
Não quero deixá-la.
Minha urna é levada até o destino. Não sinto medo. É tudo
natural. Sinto apenas falta de ter passado mais tempo ao lado de minha
princesa.
Os rodilhos rolam e minha urna desce. Minha viúva chora em
silêncio. Já aceita o que ocorreu.
Uma leve dor passa pelo seu seio direito e ela o toca.
Sua mão direita toca sua barriga.
Ela olha para o fundo da cova, para o caixão onde estou.
Sua mão se move em círculos em sua barriga.
Com uma fé inabalável, ela diz:
- Esse boboca nunca me deixaria sozinha...