Antropologia da Hemorróida


Que a alimentação pode influenciar no surgimento de hemorroidas é algo indiscutível, mas poderia a presença ou ausência desse problema influenciar a evolução do homem, desde o tempo das cavernas até hoje? É isso que analiso neste texto.
Não cheguei nesse assunto do nada. Estou com uma hemorroida danada desde ontem. Atrapalha a vida para tudo. E sentar-se é apenas o começo. Atrapalha para dormir, para levantar, para fazer força. Atrapalha a pensar, por que qualquer raciocínio é intercalado pelo pensamento “tem um negocinho me incomodando...”. Atrapalha até para comer, por que você olha um prato maravilhoso com uma pitada de pimenta e se pergunta: “Para entrar beleza, mas e mais tarde?”
E sim, atrapalha para fazer sexo. Não dá para ter prazer ou um orgasmo com um negócio latejando no seu rabo – independente da forma como cada um tem prazer, não dá conceber isso não.
Como minha alimentação vem sendo muito saudável em comparação ao meu passado, me perguntei o porquê de estar assim. Não bebo mais, então já é algo a descartar. Comi umas pimentinhas ontem, mas eu já estava com dor antes. Talvez piore por causa dela, mas não foi a culpada. Então atentei para a forma como venho me alimentando: a velha e conhecida dieta de proteínas – ou do Dr. Atkins, ou de corte de proteínas, ou dieta do glúten, como estão chamando agora. É quase sempre idêntica, apenas com alguma diferença de filosofia ou a citação de algum estudo. Eu a resumo assim: não coma nada em que exista farinha – chamo carboidrato de farinha – ou açúcar. Na primeira visita a um supermercado você já entende como ela é restritiva. Além da seção de carnes, você só pode ter acesso à uns 30 por cento da seção de legumes e a alguns itens daquele meio corredor de dietéticos. E tem que passear entre essas seções passando apenas pelo corredor de produtos de limpeza, porque de resto dá vontade de comer tudo. Se as pessoas fossem sinceras, daria para definir a dieta assim também: “olhe para um alimento. Se te der vontade de comê-lo, é porque não pode”. Depois de uma semana, você já não aguenta mais comer brócolis e bife. Comprei um pote de patê de presunto e tive que passá-lo em uma carne de hambúrguer porque não ia ter coragem de comê-lo em colheradas.
Talvez essa dieta tenha alguma culpa. Lembrei que minha mãe teve um problema de queda da bexiga, após algum tempo seguindo-a. Como ela resseca um pouco o intestino – não pode comer sucrilhos e nem a sem graça da aveia – ela pode causar uma certa prisão de ventre. Mamãe fazia muita força no banheiro e machucou a bexiga. Eu talvez tenha machucado o toba.
E foi justamente no banheiro que li uma entrevista com um nutricionista americano falando sobre a dieta Paleo – é a porra da dieta do dr. Atkins de novo. A filosofia agora é que como o homem pré histórico era forçado a seguí-la o nosso organismo formou-se adaptado a isso. Muita proteína animal, alguns legumes variados e umas poucas frutas. O consumo de grãos,cereais e até mesmo de tubérculos como batata e cenoura são coisas que só a revolução industrial trouxe. Prega-se que até uma bonita refeição de frutas deliciosamente doces seria prejudicial a saúde, já que teria uma potência glicêmica muito alta. Qualquer fonte de calorias fáceis seria desaconselhável. Nosso arroz do dia-a-dia no Brasil ou os produtos a base de milho nos Estados Unidos eram inexistentes antes da agricultura moderna e podem hoje colocar a nossa disposição uma quantidade perigosa de calorias vazias de nutrientes variados. Pelo menos é o discurso dos defensores dessa dieta.
Não dá pra concluir que o menu Paleo seja saudável ou que o homem das cavernas tivesse boa saúde. Dá apenas para ter a certeza de que ele seguia essa dieta, já que não havia outra. Então tentei inferir o seguinte raciocínio: teria ele hemorroidas? Me parece um contra senso, já que hemorroidas é uma condição incômoda o suficiente para atrapalhar a sexualidade do nosso antepassado. Com saúde, ele viveria mais tempo, mas transaria menos por causa da hemorroida. Com uma dieta menos saudável ele transaria mais por não ter hemorroidas, mas viveria menos. Nas duas situações seus genes teriam dificuldade para seguir adiante. Como achar lógica na evolução que viria a seguir?
Fui interrompido por uma mensagem de minha namorada. Queria saber o que faríamos a noite. Expliquei-lhe que estava com dor por causa da hemorroida, mas que faria qualquer coisa para alegrar a noite dela. Ela me perguntou se até sexo. Tentei explicar-lhe que a hemorroida atrapalhava e ela rebateu dizendo que não queria me comer. Bom, deixei para terminar a conversa com ela pessoalmente.
Mas a conversa me ajudou a concluir esta análise. Talvez o homem pré histórico conseguisse ter saúde e vida longa para sustentar sua família seguindo a dieta Paleo, enquanto o Ricardão de maus hábitos alimentares, chegado em comidas mais moderninhas como batata frita e pipoca, se encarregasse de passar adiante seus próprios genes. Preferi deixar o estudo da evolução para os fãs de Darwin e não pensar mais no assunto. 

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